sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Estuda, tchê: Artesanato Típico - Parte 1


Definindo Arte e Artesanato

 Alguns folclorista brasileiro agrupam, sob o título de Artes populares todas as técnicas tradicionais empregadas pelo povo. Desse modo, incluem, nessa área, tanto a construção de um rancho de torrão, ou de um barco, como o trabalho de uma tecelã ou de um ceramistas, etc... 

Outros atores classificam as manifestações artísticas do povo como artesanato. 

Rossini Tavares de Lima e Renato Almeida fazem uma distinção entre artesanato e arte popular. Diz Rossini (1976): “Não é possível incluirmos na categoria de artesanato as pinturas de bandeiras de Santos, os ex-votos na forma de esculturas de cabeças , as xilograduras dos folhetos de literatura de cordel, os desenhos coloridos das carrocerias de caminhão e os exemplares de cerâmica figurativa que existem por todo Brasil. Nesses exemplares muito diferente dos produtos de artesanato, observa-se o predomínio de elementos decorativos na definição de uma expressão estética. Os homens que desenvolveram as atividades referidas não podem e não devem ser situadas no mesmo plano de um paneleiro , cesteiro ou um fazedor de pilões. Existe nessas atividades, a procura de alguma coisa diferente, que não inclui somente no imediatismo utilitário, se bem que as formas de arte popular posam se encontrar associados, muitas vezes, num objeto utilitário, produtos de artesanato”

Renato apoia-se na opinião de Paul Sébillot que considera como “arte folclórica aquela que não resulta de qualquer ensinamento especial, mas de uma tradição ou na necessidade de exprimir- por sinais- idéias ou coisas vistas cuja recordação pode ser agradável ou útil” (1972). 

A arte folclórica vem sendo praticada pelos mais diversos grupos humanos em diferentes épocas da história. No entender de Cecília Meirelles (1968), ela “resume os grandes trabalhos humanos” e “manifesta a sensibilidade geral dos que a praticam, por uma seleção de motivos que são uma espécie de linguagem cifrada”

Como todo fato folclórico, a arte popular é de criação espontânea e pode sofrer os fenômenos da evolução e da extinção. Como diz Ana Augusta Rodrigues, a arte popular “é feita pelo povo”, produto de sua imaginação e é a expressão do grupo a que pertence. 

Segundo E. O. Christien (1965), a arte folclórica, “limitada a uma região particular, move-se dentro de uma linha estreita e, geralmente, perpétua desenhos hereditários: a originalidade ou imaginação constituem uma exceção”

Dessa afirmativa, conclui-se que toda uma área possa se revelar por estilos artísticos definidos.

As produções de arte espontânea ligam-se, também, aos materiais disponíveis na área em que vive o artista folclórico. Segundo Rossini T. Lima (1976), o “artista folclórico não tem consciência de que produz arte e é só incluído na categoria de artistas pelos folcloristas que encontraram, no objeto de sua criação a predominância de motivos estéticos”.

Opina ainda o autor, que a “arte folclórica, como toda a manifestação de arte, explica-se no caráter pessoalismo de cada exemplar, revelador de uma cultura regional espontânea aliada à criatividade do autor”. Renato Almeida considera como arte popular: "cerâmica, escultura e pintura”

Várias definições foram propostas por folcloristas brasileiros para diferenciar arte e artesanato. Para Saul Martins (1974), o “debate a respeito da diferença entre arte popular e artesanato parece-nos sem importância, seja porque todo artista começou como artesão. Se este evoluiu para a criação de peças bem acabadas, naturalmente vira artista”. O mesmo autor nos indica as características do artesanato:

1) manual: o contato é direto entre o artesão e o material empregado, sem se considerar, naturalmente, pequenas intervenções de ferramentas ou aparelhos simples. 

2) os objetos resultam de elaboração intelectual, embora sem requinte, feitos segundo os padrões tradicionais, mas nunca em molde ou forma, nem mesmo em série. 

3) aqui se realizam formas, que podem ser apreciáveis ou suscetíveis de sê-lo, e não simples produtos. 

4) emprega-se material disponível, gratuito ou extraído no lugar ou retalhos, sobra aproveitável. 

5) doméstico ou caseiro, conta com a participação da família. 

6) o artesão não conhece a divisão do trabalho, não se organiza para a produção, sozinho executa todas as parcelas necessárias à transformação. 

Saul Martins (1974) observa, ainda, que o “tipo ou modalidade de artesanato resulta de fatores ecológicos, isto é das relações entre o homem e o meio. Adapta-se às condições locais, ao estilo de vida, às exigências da freguesia, aos recursos naturais, á ocasião. Sendo o artesanato uma manifestação da vida comunitária, o artesão faz objetos padronizados, o que empresta à sua arte um caráter regional e tradicional”

Para R. T. de Lima (1974), a expressão artesanato se dá a coisas que são feitas, no todo, por uma pessoa ou, no máximo, por pequenos grupos de pessoas. 

O artesanato possui características domésticas e, no geral, é valorizado pelo cunho pessoal de que se revestem seus produtos, elaborados à mão ou com auxílio de rudimentares instrumentos de trabalho, estes muitas vezes, confeccionados pelo próprio artesão. Pode ser erudito, popularesco e folclórico. 

Considera como artesanato: cerâmica utilitária, funilaria popular, trabalhos em couro e chifre, trançados e tecidos de fibras vegetais e animais (sedenho), fabrico de farinha de mandioca, monjolo de pé de água, engenhocas, instrumentos de música, tintura popular. E, como arte, pintura e desenho (primitivos), esculturas (figura de barro) madeira, pedra guaraná, cera, miolo de pão, massa de açúcar, bijuteria popular, renda, filé, crochê, papel recortado para enfeite... 

A classificação de Alceu Maynard Araújo (1964), a respeito dos trabalhos de confecção manual, é mais ampla e engloba, além das artes populares, as técnicas tradicionais. Nas técnicas, inclui: atafona, monjolo, engenho, alambique, etc..., construção de casas, barcos, carros e utensílios domésticos e a confecção de doçaria e comidas típicas. 

Diz Maynard (1964) sobre o artesanato: “são coisas que o homem cria, sem ensino formal, levado pela necessidade. São técnicas tradicionais elementares de que o homem se serve para melhor subsistência, no primitivismo imposto pelo meio”. Uma explicação disso temos na referência de Jean Roche a respeito dos artesanatos do colonos alemães no Rio Grande do Sul. “As memórias deste novo Robinson, chegado a São Leopoldo em 1828, provam que o motivo que levou os colonos a produzirem eles próprios, a maior parte dos artigos de uso foi a necessidade de fazer economias de toda sorte. A simples sobrevivência biológica dos emigrantes só foi possível graças ao trabalho de toda família e ao retorno (regressão) de técnicas tradicionais as mais elementares (rudimentares). Foi uma adaptação ao novo meio. O artesanato rural se dividiu em dois grandes ramos: o fornecimento dos artigos necessários à vida local e a transformação dos produtos agrícolas para vender”

A necessidade leva o individuo a recorrer a novas técnicas de subsistência. Esta é uma das causas da instabilidade da artesania. Geralmente, o artesão é improvisado e faz da atividade um “biscate”

Nem sempre as técnicas artesanais têm continuidade na família. O trabalho artesanal depende da matéria prima que, muitas vezes, não pode ser adquiridas em grande quantidade. 

O artesanato está, ainda, como diz Maynard, no círculo do “quebra-galho”, isto é, produz-se hoje para comer amanhã. 

O mercado também influi sobre a produção artesanal pois, nem sempre a peça artesanal é valorizada na localidade onde tem origem. 

Arte Folclórica 

A Cerâmica e Modelagem Folclórica 

Desde a Pré-história, a modelagem em barro tem sido uma forma de expressão do homem. A palavra cerâmica, originada do grego Keramus, designa todos os objetos de argila submetidos à queima.

Quando os portugueses chegaram ao Brasil, já encontraram os índios confeccionando objetos de barro: potes, panelas, pratos e vasos. 

Segundo Haydee Nascimento, “os primeiros jesuítas não acrescentaram nada à cerâmica indígena”. As formas: bilhas, talhas, etc... chegam através dos artesãos emigrados que introduzem, também, o torno de oleiro.

Em quase todo o Brasil são encontrados oleiros. As peças produzidas são de dois tipos: 

1) utilitário;
2) figurativo. 

Este último tipo, também denominado cerâmica figureira, é mais expressivo no Nordeste brasileiro, onde se tornou famosa a dita “Escola de Caruaru”. Destacam-se, ainda, no Nordeste, a cerâmica de Carrapicho (Sergipe) e a de Maragogipinho (Bahia). 

Em Mato Grosso e Goiás, molda-se cerâmica figurativa: São Paulo, salientam-se a do Vale do Paraíba e a de Apiaí. 

Em Santa Catarina, os barristas de São José das Palhoças produzem figuras antropomorfas e zoomorfas. 

A cerâmica utilitária é encontrada em todo território nacional (alguidares, potes, moringas, talhas, quartinhas) e se distinguem, regionalmente, tanto pela cor da peça como pelos motivos ornamentais. Observam-se, também, em peças utilitárias, as expressões artísticas, pois, muitas delas, apresentam formas antropo, zoo ou fitomorfas (moringas com figuração de mulher; mealheiros ou cofres figurando animais, assovios, cachimbos e paliteiros em forma de pássaros). 

No Rio Grande do Sul, temos apenas a cerâmica utilitária no estágio de indústria com a utilização de tornos.

Técnicas 

Embora em algumas regiões do Brasil seja considerada indígena da cerâmica de cordel (rolo ou espiral), os objetos modelados, em sua maioria são de tradição ibérica: Quartinha, moringa, etc... 

Além da técnica de cordel, utilizam-se, ainda, técnicas de levantamento e a que conta com o auxílio de forma para a base. Funciona, também, a rodeira (torno movido a pé). A técnica manual é utilizada por mulheres e crianças enquanto que a roda de oleiro é trabalho masculino. 

Ao lado dos trabalhos de barro formados há a modelagem não submetida a forno, isto é, de barro cru como as que confeccionam os barristas de Taubaté, Cunha, Piraitinga, Paraibuna (São Paulo). 

Escultura folclórica

No Brasil, encontram-se trabalhos de escultura em: madeira, pedra-sabão, pedra Grês, massa de Guaraná, balata, massa de açúcar (alfenis), cera, miolo de pão, galhos de árvores, etc... 

Renato Almeida (1974) destaca, na escultura popular brasileira, os trabalhos dos imaginários (santeiros), os ex-votos (promessas talhadas em madeiras) e as carrancas (cabeçorras antropo zoomorfas). 

São famosas, no Nordeste , as talhas pernambucanas, em especial, as de Olinda, para sua confecção, utilizam formões e um pequeno martelo, para pequenos detalhes é utilizado canivete. Os motivos são florais, bailados folclóricos, indígenas, pescadores e, também, religiosos (Cristo, Santa ceia). 

Para escurecer a madeira, usam grão de Viochene e, para dar brilho, cera.

No Rio Grande do Sul são encontradas exemplares de escultura em madeira não só representando figuras de animais mas figuras humanas (Livramento e Uruguaiana). Encontram-se esculturas em cabos e relhos (Santa Maria) e em palanques (São Gabriel). Aproveitam-se, também, galhos de árvores para transforma-los, com pequenas elaborações, em belas peças (Livramento). Esculpem-se cofres e florões para decoração de móveis, de maneira espontânea (Passo Fundo e Júlio de Castilhos). 

No Rio Grane do Sul, há trabalhos de esculturas em pedra, destacando-se:

Ivo Alves da Silva (69 anos), residindo em Santa Maria e que produz peças com temas regionais. Usa ferramentas rudimentares por ele fabricadas para talhar a pedra-arenito, procedente de Alegrete. 

Clotilde de Deus Silva (75 anos), interna no Asilo da Velhice de Uruguaiana que esculpe pedra Grês desde os seus 14 anos de idade. Produz figuras ântropo e zoomorfas usando ferramentas rudimentares como: serra de arco de barril, prego, faca, “relo” de lata e azeite. A pedra procede de Alegrete e suas peças não são pintadas. 

Pelo interior do Estado, encontram-se inúmeros “canteiros”, que esculpem pedras para túmulos, lavrando florões, cruzes, anjinhos, etc.... (São Gabriel). 

Porongos também são alvo da atividade artística folclórica. O gaúcho, que faz do mate sua principal bebida, conforme suas posses, procura obter cuia bem aparelhada, adornada com metal lavrado adredamente preparada. 

Além do trabalho de ourivesaria, as cuias são passíveis trabalhos de pirogravura e de “ bordados” ou de entalhe.

Júlio Matte (70 anos), de São Borja dedica-se ao trabalho de entalhe em cuias. Utiliza porongo doce, desenhando sobre a superfície, motivos tais como: florais, cívicos, figuras de animais e humanas com ferramentas rudimentares (macete de madeira e inúmeras ponteiras feitas de prego caibral).

Trabalhos com Papel e Tecido 

Floristas 

A confecção de flores é considerada arte. No interior do Rio Grande do Sul, as floristas, em sua maioria, dedicam-se à feitura de flores para coroas. Essas flores são feitas de papel ou de pano, tanto para ornamentação doméstica, quanto para túmulos. 

Para túmulos, as flores são geralmente parafinadas. Usam-se, também, flores de lata pintadas, mais duráveis. O papel é, também utilizado como motivo de adorno em “ bicos” de prateleiras, guardanapinhos para envolver doces, desfiados e crespos para envolver balas, etc.... 

Para que haja bordado, é necessário que exista tecido de fundo sobre o qual o tecido se realiza. São incontáveis os pontos utilizados tradicionalmente.

A renda é um entre lançamento de fios que compõe um desenho sem que haja um fundo de tecido. Confeccionam-se rendas com agulhas (comum, crochê, tricô), com navete, com bilros, etc... A rendaria mais comum, em nosso Estado, é a de crochê. 

A passamanaria e o macramé são considerados arte de origem egípcia trazidos à Ibéria pelos árabes. É um trabalho de amarração de fios. As mais delicadas franjas do Rio Grande do Sul encontram-se em Bom Jesus, São Borja, São Luiz e Cachoeira do Sul.

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