sábado, 25 de fevereiro de 2017

Estuda, tchê: Sociedade Colonial - Guerra Guaranítica (Parte 4)

Guerra Guaranítica

Os missioneiros não concordaram com a transmigração dos Sete Povos para o território entre os rios Uruguai e Paraná, atual Argentina, porque não queriam abandonar suas igrejas, cemitérios e lavouras. Os missioneiros da outra margem do rio Uruguai não aceitavam a transmigração porque lá não havia mais terras disponíveis para novos povoados, lavouras e estâncias.

Como os jesuítas queriam obedecer ao Tratado, os índios prenderam os curas, permitindo-lhes apenas que rezassem missa. Os missioneiros esparramaram-se campanha, arrebanhando os peões e posteiros das estâncias e também reunindo índios infiéis para se oporem à comissão demarcadora.

Gomes Freire de Andrade determinou a construção de depósitos de víveres e munição na confluência do rio Pardo com o Jacuí, e em Santo amaro, na metade do ano de 1751. No ano seguinte o engenheiro João Gomes de Melo começou a construção do forte Jesus, Maria e José numa colina dominante sobre o rio Pardo e Jacuí. O tenente Francisco Pinto Bandeira, com 167 aventureiros paulistas e lagunenses guarneceu o forte em construção.

O marquês de Caldelírios, comandante espanhol, comunicou que em 12.11.1752 já estavam chantados os primeiros marcos em Castilhos Grandes. No entanto, 600 índios missioneiros de São Miguel, comandados pelos alferes-real Sepé Tiaraju, detiveram os demarcadores em santa Tecla, a 27.02.1753. Os demarcadores retrocederam, atribuindo a rebeldia dos índios às intrigas dos jesuítas, que pretendiam proteger as supostas minas de ouro e prata. Desde aquela época corria a lenda dos tesouros jesuíticos.

O cacique Nicolau Neenguiru, de Concepción, reuniu os cabildos dos Sete Poros para redigirem cartas ao rei de Espanha, relembrando os serviços prestados e protestando contra a mudança, por serem súditos fiéis de Fernando VI.

Andonaegui, governador de Montevidéu, partiu com dois mil soldados, em Uruguai, enquanto Gomes Freire de Andrade aguardava em Rio Pardo para atacar a redução de São Miguel. O inverno rigoroso liquidou com a pastagem e os espanhóis perderam a cavalhada e o gado de municio, tendo que bater em retirada. O cacique Paracatu, com os seus índios de Japeju, partiu em perseguição dos invasores, atacando o acampamento, roubando cavalos e matando espanhóis. No dia seguinte os espanhóis partiram em perseguição dos japejuanos, matando mais de 120 índios. As tropas de Andonaegui retiraram-se para Montevidéu, obrigando Gomes Freire a permanecer em Rio Pardo de agosto a dezembro de 1754.

Em agosto de 1754 chegou o Regimento de Dragões comandado pelo tenente-coronel Tomás Luís Osório, com 420 soldados e 70 escravos. A 16.01.1756 os exércitos luso-brasileiro e espanhol se encontraram nas cabeceiras do Rio Negro, no Campo das Mercês, e avançaram paralelamente pela Coxilha Grande, em direção aos Sete Povos, sofrendo ataques de guerrilhas armadas por Sepé Tiaraju, por estarem em terras da estância de São Miguel os índios das outras reduções não auxiliaram os miguelistas.

Em 07.02.1756, Sepé preparou uma emboscada para uma patrulha espanhola, mas Andonaegui ocultou 200 soldados espanhóis e portugueses que, no momento oportuno, atacaram os miguelistas cercando um índio com fardamento de oficial espanhol. O cavalo do chefe índio caiu num buraco cavado por touros, sendo morto pelos soldados ibéricos. No bolso da farda do cacique encontraram um livro de oração e duas cartas, que permitiram identificá-lo como sepé Tiaraju. O mito de Sepé Tiaraju inicia com o poema Uraguai, escrito por Basílio da gama em 1769, como propaganda anticlerical. Ao longo do tempo, os literatos agragaram novos dados ao mito, como Simões Lopes Neto, Mansueto Bernardi, Manoelito de Ornellas e Walter Spalding que, em 1956, cita a belíssima frase: “esta terra tem dono e ninguém nô-la tira!” Esta frase já foi usada por Romário Martins, em 1941, na obra Guaicará, dita por personagem literário homônimo que luta contra os paulistas no Guairá no século XVII, conforme Osório Santana Figueiredo.

No dia 10.02.1756 as tropas ibéricas avançaram até as lombas junto ao passo do arroio Caibaté, onde encontraram entrincheirados e em ordem de combate 1500 guaranis comandados por Nicolau Neenguiru, corregedor de Concepción. Quando iniciou o combate, os guaranis dos Sete Povos ainda estavam reunidos e discutindo que seria o chefe, pois não admitiam um chefe único.

Os missioneiros armados de flechas, lanças, boleadeiras, três peças de artilharia de taquaruçu e algumas velhas espingardas, enfrentaram dois exércitos bem armados e treinados que avançavam em quadros disciplinados, esmagando a resistência bisonha dos índios. Massacraram um militar e aprisionaram 127 guaranis. Os portugueses tiveram 18 feridos e um morto, enquanto os espanhóis computaram 10 feridos e dois mortos.

Os missioneiros resistiram ao longo da áspera subida da serra de São Martinho, armando emboscadas e rápidos ataques da guerrilhas. A 16.05.1756 os aliados entraram em São Miguel, que ardia em chamas. A chuva torrencial apagou o incêndio. A seguir os padres e índios vieram a São Miguel prestar vassalagem ao comandante espanhol, enquanto alguns grupos sustentavam a guerrilha até serem totalmente eliminados.

Os soldados espanhóis pilharam os Sete Povos, enquanto os luso-brasileiros em Santo Ângelo respeitavam os índios e estavam proibidos por Gomes Freire de pilhar as propriedades indígenas. Os missioneiros se refugiaram em santo Ângelo, colocando-se sob a tutela de Gomes Freire.

Espanhóis e lusos não se apressaram em cumprir o Tratado de Madri, pois os espanhóis descobriram que não estavam entregando simples aldeias indígenas, mas sete povoados com imensas igrejas de pedra, casas com telhas e lavouras produtivas. Os portugueses convencidos que não havia ouro e prata na região missioneira e com ameaças de rompimento de paz com a Espanha, retiraram-se para Rio Pardo, levando mais de dez mil guaranis, cavalos e gado vacum. Com esses guaranis fundaram São Nicolau da Cachoeira em 1758, São Nicolau de Rio Pardo em 1758 e Nossa Senhora da Aldeia dos Anjos (Gravataí), em 1762. O objetivo da transmigração dos guaranis para a Aldeia dos Anjos e para São João Batista era afastá-los dos espanhóis que os utilizavam como milicianos.

A guerra guaranítica destruiu moralmente as reduções, abalando a confiança dos índios nos jesuítas e nas autoridades, destruiu estâncias e ervais, deu aos portugueses o território da margem esquerda do rio Jacuí, desde a guarda de Cachoeira até o lago Guaíba, dividindo imediatamente em sesmarias.

Fonte: 
Livro História do Rio Grande do Sul
Moacyr Flores

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